“Quando o seu papel é vestir as maiores estrelas de Hollywood, você deve ser um artista, um psiquiatra e, acima de tudo, um diplomata”, afirmou Edith Head, estilista americana que venceu nada menos do que 8 Oscars de melhor figurino, consolidando-se como a mulher que mais conquistou as invejadas estatuetas em toda a história. Head, que viveu entre 1897 e 1981, teve seu auge nos anos 1950, na assim chamada Época de Ouro do cinema americano.

Nesse período, floresceram alguns dos maiores nomes da sétima arte, como Cary Grant, Marlon Brando, James Dean, Audrey Hepburn e Marilyn Monroe. E mais: nele nasceram muitas das tendências que observamos até os dias atuais, como por exemplo a camiseta branca e a jaqueta de couro. A década de 1950, marcada por um desabrochar cultural sem precedentes e por um forte otimismo e fartura pós-Segunda Guerra, estimulou o nascimento de perspectivas sociais e artísticas novas e, como consequência, foi fundamental para a moda masculina.

Caracterizada por uma combinação de extravagância e conservadorismo, que sem dúvida era reflexo do boom pós-guerra, a moda masculina da década foi influenciada tanto pela austeridade dos anos 1940 quanto pelas novas tendências da cultura juvenil emergente, e passou a incorporar mais cores, mais estampas e estilos mais casuais. A Época de Ouro foi um período de transição, de elegância e também do nascimento dos estilos casuais modernos, e o cinema não apenas refletiu, mas também moldou, tendências e comportamentos. A indústria cinematográfica dos anos 1950 fomentou uma série de elementos, acessórios e estilos que perduram até hoje.

Filmes como “O Selvagem”, de 1953, e “Juventude Transviada”, de 1955, fizeram mais – muito mais – do que somente narrar histórias interessantes. Esses filmes apresentaram uma estética visual única. Seus trajes ajudaram a definir o que era elegante, o que era estiloso e o que era moderno.  Nessa edição do MMJ, que visa homenagear o cinema antigo e seus ícones, examinaremos 10 dos filmes mais estilosos dos anos 1950. Com isso, não estaremos apenas revisando um longo catálogo de tendências antigas; estamos mergulhando em um período de criatividade, de inovação e de mudança que definiu o ritmo da moda masculina por décadas. Pegue uma taça e brinde conosco a esses momentos de brilhantismo estilístico, e sinta ressoar dentro de você estes momentos históricos da moda masculina no cinema e no mundo.

O SELVAGEM (1953)

“Fazer parte deste filme foi uma grande diversão”, afirmou Marlon Brando, muito tempo depois da estreia de “O Selvagem”, possivelmente o filme mais importante dessa lista. “Só que nunca esperei que tivesse o impacto que teve. Fui tão surpreendido quanto qualquer outra pessoa quando a camiseta branca, a calça jeans e a jaqueta de couro tornaram-se o símbolo por excelência da rebeldia e esgotaram-se rapidamente nas lojas”. Foi, então, para a surpresa – e acreditamos que também para a satisfação – do próprio ator que sua imagem em “O Selvagem” tornou-se emblemática. A jaqueta de couro, em particular, que até então nada mais era do que uma peça prática para motociclistas, transformou-se em um ícone de estilo atemporal, adotado por diversas subculturas e gerações como símbolo de rebeldia e resistência.  A influência de Brando e de “O Selvagem” na moda foi imensa, inspirando a popularidade do estilo bad boy, com elementos utilitários, rústicos e um charme despreocupado.

JUVENTUDE TRANSVIADA (1955)

James Dean se tornou de tal modo um símbolo da rebeldia e da sensualidade que ele está presente no imaginário cultural até hoje. Afinal, se Taylor Swift em “Style” e Lana del Rey em “Blue Jeans” citaram o ícone de maneira elogiosa, pode ter certeza que legiões de pessoas pensam igual. Com o figurino do icônico designer Moss Mabry, nomeado para 4 Oscars,  o  filme cristalizou a imagem do jovem inconformado e introspectivo, cujo estilo tornou-se um símbolo de uma geração que desafiava o status quo. Dean, com sua icônica jaqueta vermelha de nylon, camiseta branca e jeans azul, encapsulou uma estética capaz mesmo de transcender a tela, estabelecendo um “atalho visual para a rebelião”, como colocou G. Bruce Boyer, historiador de moda e autor do livro “True Style: The History and Principles of Classic Menswear”.

UMA RUA CHAMADA PECADO (1951)

Baseado na obra de Tennessee Williams e dirigido por Elia Kazan, esse filme é um marco no cinema americano. Mas, mais do que vermos o personagem de Marlon Brando bêbado chamando por sua Stella, ou Vivien Leigh em uma performance fenomenal que a levou a ganhar seu segundo Oscar, o encanto do filme é a maneira como o seu figurino encapsula as personalidades, os passados e as convicções de cada um dos personagens.  Em uma era em que os atores não contavam com a ajuda de suplementos e treinos intensos na academia, Marlon, ainda mais forte e mais esbelto do que de costume, exemplificou uma virilidade bruta e um charme rude, descuidado que se tornou icônica.   A simplicidade de seu traje, que destacava o seu corpo de forma quase teatral, contrastava com as tendências mais formais e contidas que até o momento dominara a moda. A figurinista do filme, Lucinda Ballard, lembra-se que o que a inspirou foi a visão de escavadores em Manhattan. “Suas roupas estavam tão sujas que se colavam aos seus corpos. Era suor, é claro, mas eles se pareciam com estátuas. Pensei, é isso que eu quero: o brilho da animalidade”, lembrou-se anos depois.

GUYS AND DOLLS (1955)

“Guys and Dolls”, de 1955, é basicamente uma joia cintilante do cinema musical que, para a nossa sorte, brilhou tanto na tela quanto no universo da moda. O filme, protagonizado  por Marlon Brando e por Frank Sinatra, cativou as audiências com suas melodias alegres e contagiantes, seus diálogos espirituosos e seu visual sofisticado. Ambientado na cidade de Nova York dos anos 50, “Guys and Dolls” exibe um desfile de trajes masculinos invejável composto por ternos bem cortados, chapéus estilosos e gravatas chamativas. Os cuidados com os detalhes, desde os padrões dos tecidos até a precisão dos cortes, destacou o quão importante é o vestuário para refletir a personalidade e o status social de um personagem – e de uma pessoa.

MATAR OU MORRER (1952)

Como falar de moda sem citar ao menos um filme de faroeste? “Matar e Morrer”, dirigido por Fred Zinnermann e estrelado por Gary Cooper, é um dos mais memoráveis westerns da história do cinema. Ambientado em uma pequena cidade americana, o filme explora uma série de questões, como coragem, honra e sacrifício. O vestuário do protagonista, o xerife Will Kane, reflete perfeitamente a sua integridade e resoluta determinação. Vestindo um distintivo de xerife, um chapéu de abas largas e uma camisa clara com um colete escuro, o personagem personifica o arquétipo do herói do oeste americano. O filme revitalizou o interesse pelas roupas ligadas ao Velho Oeste, incentivando homens a incorporarem uma série de elementos como chapéus, coletes e botas em seus guarda-roupa diários.

CINDERELA EM PARIS (1957)

Ah, Fred Astaire. O maior dançarino da história do cinema, e sem dúvida um dos homens mais estilosos a darem a graça de sua presença nas telas. Em “Cinderela em Paris”, temos um prato cheio para amantes de moda masculina e também feminina. O filme transcende a fronteira entre cinema e moda, celebrando o encanto e a elegância da alta costura. Uma história despretensiosa sobre uma jovem atendente de livraria transformada em modelo internacional nos oferece, em última instância, uma visão fascinante do mundo da moda em Paris.  Embora a moda seja abordada especialmente através dos figurinos belíssimos e inesquecíveis utilizados por Audrey Hepburn, é igualmente notável a sutil, porém muito significativa, influência que o filme teve na moda masculina. Inspirado no real fotógrafo de moda Richard Avedon, o personagem de Astaire exibe uma elegância atemporal com seus ternos bem cortados e seu estilo impecável. Uma ode à beleza e à sofisticação e uma fonte de inspiração a homens e mulheres até os dias de hoje, “Cinderela em Paris” encanta também por seus números musicais.

LADRÃO DE CASACA (1955)

Como poderia uma lista de filmes dos anos 1950, mesmo focados em moda, deixar de ter ao menos um clássico de Hitchcock? Bem, nessa lista temos dois, e o primeiro deles é um dos meus favoritos: “Ladrão de Casaca”, que combina suspense, romance, glamour e uma série de figurinos femininos e masculinos de cair o queixo na deslumbrante Riviera. Cary Grant interpreta John Robie, um ex-ladrão de joias que exibe uma elegância impecável. Seu guarda-roupa, consistindo de ternos bem cortados, camisas de cores claras, gravatas discretas e suéteres listrados, define um padrão de vestuário masculino que encapsula a sofisticação e a discrição, sugerindo o passado misterioso de seu protagonista ao mesmo tempo em que mantém uma aparência charmosa e acessível.

ALTA SOCIEDADE (1956)

“Alta Sociedade” é um musical cintilante que brilha no firmamento do cinema clássico por conta da combinação de músicas cativantes – de ninguém menos que o meu compositor favorito, Cole Porter, que fique aqui registrado –, diálogos espirituosos e um elenco mais do que impressionante composto por Grace Kelly, Bing Crosby e Frank Sinatra.  Os trajes masculinos no filme são um verdadeiro destaque, refletindo a sofisticação e o status social dos personagens envolvidos. Contando com uma estética Old Money, o filme proporciona uma visão do vestuário masculino como uma forma de expressão de refinamento.

INTRIGA INTERNACIONAL (1959)

Dirigido também pelo mestre do suspense Alfred Hitchcock, “Intriga Internacional” é uma história de espionagem emblemática que combina intriga, romance, ação e… moda, pois juntamente com “O Selvagem” é considerado um dos filmes mais influentes dos anos 1950 no que se refere a moda masculina, graças ao estilo impecável de Grant. No filme, Grant interpreta um publicitário que é confundido com um agente secreto. A sua vestimenta é, em essência, uma extensão de sua personalidade sofisticada e urbana.  Vestindo um terno cinza feito sob medida, o personagem reflete uma elegância e uma compostura essenciais para enfrentar as adversidades que o enredo lhe reserva. O ator, conhecido pelo seu senso de estilo, reforça neste filme a ideia de que a moda masculina pode ser ao mesmo tempo refinada e prática. A preferência por linhas limpas, tecidos de qualidade e o ajuste perfeito foram adotados por homens em todo o mundo, aspirando replicar a encantadora aura de acessibilidade e autoridade exibida pelo ator.

SINDICATO DE LADRÕES (1954)

“Sindicato de Ladrões” é um filme profundamente enraizado nas tensões sociais e de lutas pelo poder na sociedade americana do pós-guerra. A obra, que explora as complexidades da corrupção sindical e a redenção pessoal, não só ganhou vários prêmios da Academia, incluindo Melhor Filme, mas teve um impacto notável na moda masculina da época, em especial através do estilo de Brando. O ator, que interpreta Terry Malloy, um jovem ex-boxeador que se torna um peão nas mãos de um sindicato corrupto, veste-se de maneira simples e funcional, refletindo a sua situação e ambiente: camisetas básicas, jaquetas de lona e jeans ou calças de trabalho. Este visual enfatiza a vulnerabilidade e rudeza de Terry e, ao mesmo tempo, populariza a estética do “homem comum”, com todo o seu realismo crítico.

JAILHOUSE ROCK (1957)

“Jailhouse Rock”, estrelado por Elvis Presley, foi um marco na carreira cinematográfica do Rei do Rock e exerceu uma influência significativa na moda da época. O filme, conhecido por suas vibrantes performances musicais e pela emblemática coreografia de Presley, foi um divisor de águas: destacou um estilo que viria a definir toda uma geração. Nele, temos Vincent Everett, um jovem que se transforma de delinquente a uma estrela do rock. Seu estilo é um reflexo direto da cultura jovem rebelde dos anos 50 e 60, encontrando-se bem no limiar dessas duas décadas. Com jeans justos, camisetas básicas e jaquetas jeans e de couro, Elvis personifica o protótipo do “bad boy” charmoso e carismático, um visual que capturou imediatamente a imaginação do público jovem. E, se a tendência começou anos atrás com Brando e Dean, foi Presley quem cimentou de vez esse estilo como uma parte integrante do guarda-roupa masculino na cultura popular.

CANTANDO NA CHUVA (1957)

“Cantando na Chuva”, dirigido por Gene Kelly e Stanley Donen, é muitas coisas em uma única: um filme musical exuberante e alegre, mas gravado em meio a sangue, suor e lágrimas (e febre, pois Gene Kelly dançou a icônica cena na chuva doente, com uma febre de 39 graus). E um filme surpreendente moderno, mas ao mesmo tempo uma cápsula do tempo que captura o glamour e a evolução da indústria cinematográfica durante a transição do cinema mudo para o sonoro. Lembrado por suas sequências de dança inovadoras e músicas cativantes, temos que tirar nosso chapéu para a equipe de figurinistas. Gene Kelly, como Don Lockwood, exibe um guarda-roupa que é um testemunho de elegância e estilo nos anos 20 e 30 – período em que se passa o enredo. Seus trajes bem cortados, chapéus Fedora e sapatos de dança não apenas complementam sua performance dinâmica, mas também refletem a moda masculina da época, que valorizava a silhueta nítida e a atenção aos detalhes. Enquanto as roupas de Gene Kelly são primorosamente adaptadas para a dança e a movimentação, elas também promovem uma imagem de sofisticação descomplicada que se tornou um ideal para o público masculino. A famosa cena da chuva, com Kelly usando um terno leve e um chapéu Fedora enquanto dança e canta sob uma chuva torrencial, ajudou a cimentar a imagem do traje masculino como uma forma de expressão pessoal e arte.


Artigo publicado originalmente na edição #038 do MM Journal.

O MM Journal é 100% gratuito para baixar. É só inserir seu nome e email no box, que você será redirecionado para a edição digital em PDF. Se você preferir, pode ler o MMJ também no seu navegador, acessando a galeria abaixo.

LEITURA ONLINE